terça-feira, 30 de setembro de 2008

Quando?

Estamos habituados a que as crises tenham um formato. Sejam ciclicas e sinusoidais. Tenham uma quebra grande ou duas, e acabem, iniciando-se uma lenta recuperação.
Esta crise não é assim. É um vulcão de crises consecutivas, uma espécia de tsunami de vários abalos, que afecta a cada onda mais do que a anterior, dando evidência a uma dúvida a que ninguém sabe responder (e quem souber vai enriquecer rapidamente): Quando chegamos ao fim? Quando acaba o efeito de novas descidas, falências e escândalos financeiros?
A esta pergunta acrescento outra: porque é que não temos ainda ouvido falar (ou temos pouco) de mandatários da China e dos países do Médio Oriente para compra massiva de empresas desta dimensão, ao preço do caramelo, tendo em conta a excelente oportunidade (não do negócio, mas do peso politico [controlo] adjacente)??

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

E se a "coisa" chega cá?

Não se tem falado muito da possibilidade de algum grande banco da zona euro colapsar. Um indicador de que há riscos é o facto de a Euribor continuar a subir diariamente e de os bancos preferirem depositar no BCE a 3.25% do que a 4.90% nos seus pares. Mas há quem esteja preocupado. Daniel Gros do Centro Europeu de Estudos Políticos diz que os bancos europeus são mais endividados do que os americanos e que não existe uma instituição de grande dimensão pronta a socorrê-los em caso de um aperto, como a FED e o Tesouro. A média do "rácio de alavancagem" - que relaciona as dívidas dos bancos face aos seus activos - na Europa é de 35, enquanto que nos EUA é de 20. Por outro lado algumas instituições bancárias europeias cresceram tanto que são hoje enormes relativamente ao seu país de origem. Por exemplo o Deutsche Bank, mais endividado do que a média (rácio de alavancagem de 50), tem passivos de 2 biliões de euros, ou seja mais de 80% da dimensão da economia alemã! Como poderia o Bundesbank "salvar" o banco? Seria necessária a coordenação do BCE com todos os governos europeus... E há quem não esteja preocupado. Trichet disse na terça-feira - para quem quis ouvir - que o papel do BCE é de fornecer liquidez, mas não tem responsabilidades sobre problemas de solvência dos bancos. Com amigos destes...
(Artigo publicado no jornal Meia Hora em 26-Set-08)

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Mal Pagos

Desde os primórdios dos tempos que um misto de incapacidade e visão estratégica com pura inveja fizeram com que os povos na sua globalidade e os portugueses em particular consideram que quem os gere tem demasiadas compensações e mordomias, exageradas regalias, incompreensíveis salários. Eu acho que estes tiques são da era binária (fascisto-comunista) e representam a mais lamentável mediocridade da nossa sociedade. Os políticos são mal pagos. Os vencimentos a cada uma das classes políticas, e nomeadamente os de autarcas, deputados, secretários de estado ou ministros são uma lástima. Pronto, refaça-se desse ar de surpresa, que eu farei parágrafo para dar tempo. Sou talvez o mais insuspeito dos indivíduos nesta matéria. Não fui nem sou político e a probabilidade de o vir a ser é semelhante ao Metro do Porto arrancar com novas extensões em breve... De facto, e exceptuando compensações de outra natureza (Murteira Nabo, Jorge Coelho e outros que assumiram novas funções, tomando partido da sua notoriedade) a carreira política – ou mesmo uma breve passagem por cargos desta natureza – não é atractiva para a nata dos gestores nacionais ou até mesmo para os gestores jovens com elevado potencial. Recebe-se demasiado pouco, face ao mercado. Não é menos, é absurdamente menos, para o correspondente nível de responsabilidade Aumentar os vencimentos da classe está fora de hipótese, porque tal medida apenas iria tornar a carreira mais apetecível aos demais – os que se permitem nela entrar por outros atributos que não a competência – não se tornando necessariamente atractiva o suficiente para os gestores que saberiam dar outra qualidade à governação – leia-se os que governam e os que fazem aquilo a que absurdamente se chama de oposição, em vez de cooperação. O que proponho é um quadro de vencimentos mistos : por execução do cargo (como actualmente) e por desempenho/resultados, que seriam por sua vez resultados mensuráveis e atingíveis, e estivessem ligados ao programas eleitorais de cada partido, em ligação com os resultados do país e de cada departamento (ministério, sector, etc). A supervisão seria feita, em última análise, pelo Presidente da Republica – em ligação com a AR. Esta medida tinha reflexos positivos em todos os quadrantes. A carreira política ficaria mais apetecível aos gestores mais talentosos, ou com melhor “fit” para as funções respectivas. Os bons gestores na política – existentes e novos – seriam devidamente recompensados. O Presidente da República teria um novo poder, não executivo, reequilibrando a balança de importância relativa no desempenho do país. E, mais importante, dava-se ao país um sinal educativo – recompensa por resultados em vez de por posições.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Modelo falido

A crise financeira que afecta bancos, seguradoras e de, um modo geral, quase todos os investidores por esse mundo fora, está ao rubro. A imprensa relata que a estabilidade do sistema financeiro está no fio da navalha. E, de facto, a realidade não anda muito longe disso mesmo. O Tesouro e a Reserva Federal norte-americana, honra lhes seja feita, estão a fazer de tudo no sentido de evitar que a economia moderna regresse à era medieval. Há uns meses atrás, financiaram a compra do Bear Stearns – o quinto maior banco de investimento em Wall Street – pela JP Morgan. Há duas semanas, nacionalizaram os dois maiores bancos do mercado de hipotecas: a Fannie Mae e o Freddie Mac. E, agora, acabam de nacionalizar a sua maior seguradora: a AIG. Pelo caminho, abriram uma excepção e deixaram que a Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimento na América, declarasse falência. Infelizmente, o Tesouro e a Reserva Federal são também os maiores responsáveis pelo descalabro actual. Primeiro, foram incapazes de adequar a regulação à inovação financeira dos últimos anos e permitiram que títulos transaccionados em mercados não cotados ameaçassem o equilíbrio global. Segundo, passaram anos a abrir a torneira do crédito – na forma de juros baixos e injecções monetárias – em vez de a fecharem, numa extraordinária conivência com os interesses instalados de Wall Street. Agora, em desespero, tentam remediar da melhor maneira possível. Na prática, esta crise financeira evidencia a incapacidade auto reguladora do liberalismo económico. E, em certo sentido, representa a falência deste modelo. Artigo publicado no jornal “Meia Hora” a 19/09/2008

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

O Mundo a andar para trás...

Não foi agora, mas o ciclo mudou.
Desde a década de 80 que nos acostumamos a ver o mundo a melhorar. Caía o muro de Berlim, terminava a guerra fria e o medo do nuclear. Mais democracias e povos livres. O colapso da URSS trouxe sementes da liberdade e prosperidade a milhões de pessoas, inspirando o desenvolvimento de economias de mercado e de princípios de exigência face aos governos, cada vez mais laicos e liberais. Os anos 90 trouxeram a internet e os princípios de trabalho em rede que fomentaram o contacto entre os povos e, naturalmente, uma maior tolerância e entendimento. A história é cíclica. A liberdade e a democracia estão a ser ameaçadas pelo regresso do autoritarismo. Os indícios são muitos e à vista de todos: o regresso do músculo russo, a celebração do poder e autoridade em Pequim, a força dos produtores de petróleo. As religiões e o populismo que se misturam, subvertendo as oportunidades que a liberdade de expressão permite. E às vezes o liberalismo também se "põe a jeito". A ganância e a fraca supervisão permitiram ao sistema financeiro aceitar riscos que hoje se pagam. As ameaças brotam também no dito "mundo-livre". A popularidade da candidata Sarah Palin é assustadora, quanto mais não seja por defender o criacionismo, negando a teoria da evolução de Darwin, cujo ensino pretende proibir. Os fundamentalismos não são exclusivos do oriente, estão em todo o lado. A democracia está sempre em risco e o 11 de Setembro lembra-nos disso mesmo.

Não interessa

O JN de hoje noticia que a RyanAir desistiu da ideia de criar uma base na cidade do Porto. Supostamente devido à inflexibilidade da ANA que não concedeu à transportadora o desconto de 4 euros por cada passageiro embarcado que esta tentava negociar. Diversas personalidades associadas à região Norte já manifestaram o seu repúdio pela intransigência da nossa querida monopolista ANA.
A RyanAir, como qualquer "low cost", vive destes subsídios ou descontos negociados com as entidades aeroportuárias. Os seus baixos preços, ao contrário da mensagem que tentam passar, não resultam necessariamente da dimensão reduzida das suas tripulações ou da rotação elevada que operam na sua frota de aviões. O seu "business plan" depende da abertura negocial dos poderes regionais das zonas onde estão implantadas. Independentemente da admiração que se possa ter, ou não, pela estratégia, a verdade é que as "low cost" são hoje os principais dinamizadores de certo turismo, em particular, dos famosos "city breaks" - fins de semana alargardos, passados noutras cidades de outros países.
Os números que a RyanAir colocou na mesa das negociações, como objectivo de atraccção turística para a cidade do Porto, eram impressionantes: cerca de 7 milhões de turistas nos próximos anos. Mais de vinte vezes a actual população da cidade e que arregala os olhos de qualquer portuense, ciente de que esse afluxo acrescentaria mais acção ao Porto. Infelizmente, a ANA, como entidade monopolista e sediada na capital de um Portugal cada vez mais assimétrico, não tem a mínima sensibilidade para estes números. Na realidade, está-se nas tintas para isso.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

O elefante branco

1. A Tailândia é um reconhecido país asiático onde vivem cerca de 65 milhões de almas (na capital Banguecoque viverão cerca de 10 milhões) que, na sua grande maioria (85%), compartilham a mesma cultura e língua – thai – e professam o Budismo. A sua estrutura política é de monarquia constitucional. O rei Bhumibol Adulyadej, soberano tailandês desde 1946, tem pouco poder directo sob a constituição mas é um símbolo da identidade e da unidade nacional. Possui um enorme respeito do povo e grande autoridade moral, que usa para resolver as crises políticas que ameaçaram (e ameaçam) a estabilidade nacional. Não obstante as tumultuosas notícias que agora nos chegam, foi por lá, em tempo de estio, que revisitei a estória que origina a expressão “elefante branco”. Os primeiros rumores parecem remontar ao séc. XVI quando os portugueses chegaram ao antigo Sião. Compreende-se que, encontrando usos e costumes muito diferentes dos que estavam habituados, rapidamente tenham espalhado novas pela Europa. Algumas dessas excentricidades enumeravam a existência de elefantes brancos. Porém em número tão reduzido que poucos os teriam visto, mas em número suficiente para criar a curiosa história que então se contava: “a de que o rei local, quando insatisfeito com alguém da corte, presenteava-o com um desses animais considerados sagrados, passando a visitar o presenteado em horas incertas a fim de verificar pessoalmente se o bicho estava a ser tratado com a atenção necessária. O homenageado, coitado, que por razões óbvias se vira forçado a aceitar o presente do rei, dali em diante fazia das tripas coração para manter o animal sempre limpo e enfeitado, e o que é pior, procurando satisfazer o seu apetite de tamanho e peso equivalentes às quase dez toneladas de carne e ossos que carregava. Em razão disso a expressão “elefante branco” passou a simbolizar inicialmente o presente incómodo e indesejado que alguém recebe de algum engraçadinho (principalmente a partir do século XVIII, quando a comédia “O Elefante do Rei do Sião”, de Ferdinand Lalou, foi apresentada com grande sucesso ao público europeu), e, mais tarde, as coisas enormes e incomuns que ninguém sabe para que servem, como uma obra pública inacabada, por exemplo, ou o viaduto que liga o nada a lugar nenhum.” 2. O IAPMEI, já Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas, que trocou agora o Investimento pela Inovação, constitui-se como o braço do Ministério da Economia e da Inovação para as políticas económicas direccionadas às micro, pequenas e médias empresas, cabendo-lhe agenciar condições favoráveis para o reforço do espírito e da competitividade empresarial. No actual contexto assume papel fulcral na gestão dos fundos comunitários. Nele concentrou o governo as principais medidas, instrumentos e projectos – da sua análise ao encerramento, da gestão ao acompanhamento técnico e financeiro, passando, pela não menos importante, gestão de tesouraria. Dele retirou, o mesmo governo, as competências e a capacidade de decisão e execução em tempo útil. O IAPMEI cresceu, engordou e ocupa hoje uma posição de destaque no aparelho económico. Todavia, alimenta-se generosamente de atrasos, de dúvidas e silêncios, de decisões tão inusitadas quanto incompreensíveis. Subverteu a sua lógica de funcionamento: de apoio maior às empresas, sobretudo às micro e pequenas que constituem a esmagadora maioria do nosso tecido empresarial, é neste momento um pesado organismo que parece viver para se alimentar. É uma coisa branca enorme, incomum e inacabada. Não se sabe muito bem para que serve, nem o que se pode esperar. Vive impoluta e candidamente. Assim vai o país.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Saque

Tive nestas férias de Verão oportunidade para ler alguns romances de autores de veia jornalística nacionais : Miguel Sousa Tavares (“Equador” e “Rio da Flores”) e José Rodrigues dos Santos (Sétimo Selo). Fiquei surpreendido. O que aprendi com estes livros (no primeiro caso em história e no segundo em ciências) superou claramente as minhas expectativas - assentes em leitura por puro lazer e entretenimento – nomeadamente em matéria relacionada com a política colonial portuguesa. O momento foi apropriado, dado que a política colonial que parece estar de volta, não com Portugal colonizador, mas antes colonizado. Não, não me preocupam as investidas nórdicas no retalho ou espanholas na banca, nem as aquisições de fundos americanos ou asiáticos. Não me preocupa ver o mercado livre a funcionar, seguro que isso resultará em mais competitividade e portanto maior evolução, que se espera ver depois transformada em qualidade de vida. Preocupa-me quando são outros Estados a adquirir posições importantes (de dominância mesmo) nas maiores empresas portuguesas. Tudo com a complacência simpática do Escravo, digo Estado Português. As posições que o Estado Angolano – através da Sonangol – detêm na GALP e no BCP, a par com os interesses na EDP e na Brisa, são perigosos. Perigosos porque são aquisições estratégico-politicas por uma nação onde as regras de concorrência livre não são respeitadas e s empresas nacnais são pressionadas, quando não perseguidas. Talvez Portugal precise hoje mais de Angola do que o contrário, mas há limites para qualquer cedência negocial. E permitir o saque das maiores empresas por um Estado – para mais um destes – não é tolerável.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Nivelar Portugal por baixo

A CGTP propôs esta semana a criação de dois novos escalões de IRS. Política à parte, interessa discutir que mensagem efectivamente se transmitiria às empresas, trabalhadores e estudantes, caso a medida fosse aprovada.
A CGTP defende a criação de escalões de 43% e 45%, este último para rendimentos anuais acima de 250 mil euros. Claro que o reflexo para a receita do Estado seria reduzido já que o número de contribuintes nessa situação é diminuto e esses rendimentos já são taxados a 42%. Ou seja, a proposta é meramente política, mas pretende acentuar a progressividade do IRS que é inibidora de todos os aumentos salariais e penaliza a progressão das carreiras, castigando a ambição de uma carreira melhor. Com o argumento da "justiça fiscal" penaliza-se quem se preparou e se actualiza, os que em média mais valor geram para a economia, quem progride, em suma, quem tem mais mérito. Para cúmulo, empurra-se os trabalhadores e empresas para a tentação da evasão e fraude fiscais, das remunerações em espécie ou de benefícios ainda mais duvidosos. A CGTP acha que é "justo" tributar mais do que proporcionalmente os trabalhadores que merecem os seus aumentos. O castigo por ser aumentado é, portanto, pagar mais impostos. Será assim que se defende os trabalhadores? Exemplo: Para aumentar o salário liquido em 100 euros de um trabalhador que paga uma taxa marginal de IRS de apenas 25%, uma empresa terá que incorrer num custo de 180 euros... Este tipo de legislação só nivela Portugal por baixo. Nos salários, nos procedimentos e nas mentalidades. Texto publicado no jornal MEIA HORA em 5 de Setembro de 2008

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

4 vezes 3 degraus

O hotel abraçava serenamente as águas do Índico. As espreguiçadeiras, cuidadosamente alinhadas, esticavam-se sob o sol ameno quase até à praia. Apenas um murete separava o verde da relva que envolvia a piscina e o amarelo suave dos grãos de areia. Três singelos degraus de madeira ajudavam a transposição entre os dois espaços. Deste lado, o olhar atento e sempre uniformizado dos homens do “Beach Club”. Do outro, com os pés na areia e sob a carinhosa sombra de imponentes palmeiras, um barzinho de madeira servia mais simpatia e alguma dedicação. De um lado, uma cadeia internacional com uma oferta estudada, bem adequada e cuidadosamente parametrizada; do outro, uma dedicada empreendedora e um jovem trabalhador davam conta do recado. Com um calor exigente, a hidratação constituía-se tarefa importante. Para além de uma água de coco ou uma cerveja ao pôr-do-sol, beber água engarrafada é altamente recomendável. A "mesma" garrafa era valorizada a 80 baht, do lado global, e a 20 no mercado (evidentemente) local. Quatro vezes mais, portanto. Uma simples garrafa com meio litro de precioso líquido. Perceber as diferenças entre estes dois valores, implica perceber uma boa parte da nova ordem económica global. Olhar aquele murete não só como elemento estético, mas perceber a sua funcionalidade – o seu factor conversor da distância entre dois espaços. Este cenário idílico fez-me pensar nalguns dos actuais desafios que o Mundo enfrenta. E nestes grãos de areia poderemos procurar algumas das resposta que precisamos. Ou não?