quarta-feira, 30 de abril de 2008

Fashion, not Fad

Não constitui novidade que a moda portuguesa tem conseguido impor a sua marca, o seu estilo, a sua presença, dentro como fora de portas. O “mundo da moda”, os alegados prescritores dos hábitos nas próximas estações, está bem à frente, perto dos líderes mundiais do sector. Um pouco atrás, mas suficientemente perto. No entanto, da moda desenhada até à marca conseguida, da ideia até à produção, do conceito ao sucesso, da prescrição à venda, há um longo caminho a percorrer.
Há uma ou duas décadas atrás, o têxtil português estava no estado em que hoje se encontram alguns dos países de leste, totalmente dependente das grandes marcas mundiais, em regime de pura subcontratação e dependência. Da Marks & Spencer à Ecco, da Donnay à Adidas, as marcas procuravam a mão-de-obra nacional, que juntava um custo baixo a algum know how, sobretudo no Minho e na Beira Interior. Estes eram os dois factores cruciais para as marcas multinacionais fabricarem os seus produtos bem e barato. A entrada na CEE em 86 abriu algumas fronteiras para os gigantes mundiais, que reconheciam em Portugal, para além de mão-de-obra barata, a proximidade necessária aos mercados mais importantes (estrategicamente entre a Europa Central e os Estados Unidos), know how (incluíndo algum conhecimento especifico e diferenciado nas tinturarias), promessa de criação de redes viárias e estruturas base e estabilidade política. Na altura, não havia praticamente marcas nacionais de moda à venda com sucesso, excepto talvez o Grupo Maconde. A realidade socioeconómica começou a mudar, vieram os ciclos e as crises, a entrada de outros países mais competitivos ao nível de custo e deu-se início à fase do crivo: os que simplesmente faliram, os que – depois de se modernizarem e reestruturarem - continuaram em regime de subcontratação e que hoje trabalham para empresas como a Inditex, a Gant ou a Agatha Ruiz de la Prada e finalmente os que construíram as sua próprias marcas, que passaram a ocupar, mês após mês, mais tempo das máquinas outrora semi desaproveitadas, até finalmente darem por terminados os trabalhos de subcontratação, para se centrarem apenas na sua ou nas suas marcas. Este processo deu-se por duas formas distintas – os industriais do têxtil que fizeram as suas marcas de raiz (Impetus, Salsa, Tiffosi, ou Dielmar) e os que as adquiriram no mercado (Cenoura, Acetato). Há ainda os que, à semelhança dos gigantes, se concentram a gerir a marca e a subcontratar eles próprios (Throttleman, Sacoor). Pelo caminho, ficaram outros que tentaram construir as suas marcas tendo como prioridade a alocação dos seus recursos industriais existentes, em vez das necessidades do mercado. O grande desafio para os gestores de marcas de moda, sejam industriais ou não, não se limita a vender muito e consequentemente lucrar imenso: é antes criar um capital perene, que permita estabelecer uma estratégia lucrativa no longo prazo. De notar que tal pode ser concretizado recorrendo a uma aposta em boa presença da marca da roupa (Lion of Porches, Boxer Shorts, Giovanni Galli), ou simplesmente na loja (Dielmar, Dom Colletto, Lanidor). O facto dos hábitos de consumo ligados ao têxtil dependerem cada vez mais da ligação com os previamente referidos prescritores de moda, ou designers de colecções, estilos e sobretudo – mais do que tudo o resto – tendências, assim como das socialmente designadas tribos urbanas (betos, skaters,yuppies,…), faz com que possa existir um efeito de “pico de moda” repentino e momentâneo, que depois tem dificuldade em sobreviver com perenidade. A este efeito, que em Portugal não tem nome conhecido, chama-se no mundo da moda um Fad, ou simplesmente um Craze. Entre as marcas referidas, a maioria viu o seu nome ganhar notoriedade ao longo de vários anos, a pulso. No entanto, há as que sofreram um Fad – a Salsa e a Sacoor nomeadamente. Ambas as empresas souberam, através de uma estratégia de permanente mudança e readaptação, manter-se fora dos habituais precipícios que esperam as marcas saídas de um Fad. A Converse (All Star) ou a Resina são exemplos de empresas a quem isso já aconteceu, na última década. Para tal, é preciso ter uma estratégia de mudança quando se está num dos momentos altos, em vez de fazer durar o mais possível cada sucesso imediato. Saber continuar na moda por muitos e bons anos é hoje o grande desafio das marcas nacionais que souberam habilmente conquistar o seu espaço no mercado.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Impostos

A propósito do post sobre o IRC mais abaixo, esta é a minha opinião.

Milionários vigiados

Decidi iniciar esta minha colaboração no Mercado Puro com um comentário a uma excelente reportagem do Diário Económico, publicada na edição de hoje, acerca dos salários pagos a executivos de topo. O tema foi, aliás, bastante discutido por na passagem de ano quando o Presidente da República alertou para o problema da assimetria remuneratória existente entre gestores e funcionários. Na altura, escrevi um artigo com a seguinte conclusão: em Portugal os salários dos executivos, em termos relativos, são de facto bastante elevados e acima da média europeia.
Pois, hoje, o DE volta à carga com as últimas estimativas referentes aos salários dos administradores das empresas do PSI20. Gente como Ferreira de Oliveira da GALP, Zeinal Bava da PT ou António Mexia da EDP. Há números e métricas para todos os gostos. E notas explicativas que justificam certos montantes auferidos. Por exemplo, da leitura do artigo ficamos a saber que os accionistas da PT decidiram premiar a vitória dos seus administradores na OPA contra a Sonae e que, em função disso, cada administrador levou para casa 2,6 milhões de euros. Ao invés, na Sonae, a alteração do conselho de administração na Sgps resultou no pagamento de nove milhões de euros em prémios. O indicador que, pessoalmente, mais apreciei foi a remuneração avaliada em função dos lucros obtidos por cada empresa. Assim, a respeito de Ferreira de Oliveira, pude confirmar que é o gestor mais eficiente da praça portuguesa. Por cada euro recebido pelo conjunto dos administradores da Galp, a empresa ganha em média 1500 euros. No campo oposto está a Soares da Costa, quiçá, ainda a sentir a crise no sector da construção.
Há, contudo, um aspecto que merece ser sublinhado: as remunerações dos gestores baixaram cerca de 12% face ao ano anterior, comparado com a redução de 2% nos lucros das empresas do PSI20. Ou seja, a redução nos salários dos administradores foi mais do que proporcional à diminuição registada na performance global das empresas que presidem. Como não acredito que este facto se deva a um eventual espírito mais solidário e altruísta dos gestores, só pode resultar de outra coisa: maior controlo e supervisão dos accionistas que os nomeiam. E assim se rege o mercado.

Estratégias Karaoke

Numa recente entrevista, Sara Tavares revelou estranheza pelo facto dos portugueses continuarem a associar a sua imagem ao “Chuva de Estrelas”, um programa de imitação, depois de todas as suas criações que foi desenvolvendo ao longo do tempo. Com mágoa, a cantora afirmou que os portugueses dão demasiado valor à imitação e muito pouco valor à criação.
Esta realidade estende-se à forma cultural como, nos diversos domínios, se encara essa palavra da moda que dá pelo nome de inovação. A inovação tem sido tão falada e discutida, que faz mesmo parte da própria missão de muitas empresas. Empresários, gestores e administadores procuram cada vez mais imbuir as empresas num espírito de inovação constante, fazem brainstormings do tema e formam-se em pós graduações de todas as naturezas associadas ao tema. E, contudo, associam inovação a algo que pode ser descrito como “estar sempre associado às últimas tendências de mercado e procurar ter as mais recentes soluções disponiveis no mercado”. Infelizmente, isto não é ser inovador. É ser moderno, ou – em alguns casos – é apenas estar na moda.
Há muito muito tempo que se descobriu que num ambiente competitivo intenso como é o mercado globalizado onde vivemos, não é suficiente ter o mais baixo preço beneficiando das melhores economias de escala e optimizações de cadeia de valores, porque haverá sempre alguém noutro ponto do mundo que será capaz de fazer o mesmo a um preço menor. Foi mesmo há muito tempo que se percebeu que só através da diferenciação que se poderia criar valor para os clientes, que então estariam dispostos a pagar um valor um pouco superior pelo bem ou serviço em causa, fruto da sua diferenciação e unicidade. Ora a referida e supracitada noção de inovação nada traz de diferenciação - pelo contrário, acaba por tornar as empresas, os seus bens e serviços e mesmo a sua imagem cada vez mais igual, e indiferenciado.
A inovação que será sinónimo de sucesso para as empresas é a da criação de novas soluções, aproveitando potenciais oportunidades de necessidades ainda latentes nos clientes ou futuros clientes. É exclusivamente através da criação (esta sim, a “buzzword” mais importante) de novas soluções que uma empresa se destinguirá de todas as demais, diferenciando a sua oferta e produzindo valor acrescentando para os clientes.
No entanto, todas as inovações desta natureza, caso tenham sucesso, tendem a ser rapidamente copiadas pelo mercado (excepto se as barreiras à entrada forem demasiado altas – patentes, investimento em equipamento, know how especifico, etc), pelo que a única forma de as empresas conseguirem viver neste ambiente é desenvolvendo programas de constante inovação, sendo mais ágeis, rápidos e eficientes do que os seus concorrentes. E os seus concorrentes não são necessariamente as outras empresas do mesmo sector. Há dúvidas da razão pela qual Pinto da Costa e o anterior Bispo do Porto queriam encerrar o comércio ao Domingo? A razão é evidente - o comércio é concorrente de pessoas nas igrejas e no estádio, porque tem em muitos casos associação a lazer. “Marketing Myopia”, by Theodore Levitt... É preciso conhecer qual é o mercado e assim percepcionar realmente os potenciais concorrentes, estando sempre um passo à frente. Para que a empresa tenha este espírito empreendedor, é preciso que os estrategas não sejam abafados pelos tecnocratas, que os criadores não sejam limitados pelos administrativos. É preciso que – mesmo tendo em conta orçamentos e outras limitações de partida que balizam o ambiente – sejam os departamentos mais próximos dos clientes ou potenciais clientes a liderar a estratégia, em vez de viverem para servir departamentos financeiros, juridicos ou administrativos
Essencialmente, é necessário que os gestores tenham consciência de que inovação apenas por incorporação de conceitos recentes no mercado não acarreterá mais valias para os seus clientes e por consequência para a própria empresa, sendo necessária uma estratégia contínua de inovação por criação de novas soluções para realmente fazer a diferença.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

IRC Disruptivo

Sempre defendi que a baixa de impostos se deveria centrar no IRC, por ser claramente o que estruturalmente acarreta maiores vantagens ao país, influenciando o emprego e o investimento e por essa via o consumo. Torna-se necessário animar a economia de alguma forma, sendo redundante dizer hoje que o país precisa de Investimento Directo do Estrangeiro. Resulta contudo complicado competir com países de outros blocos geográficos, mais bem preparados fiscalmente e com recursos já interessantes ao nível educacional e infra-estrutural. Para fazê-lo, é preciso uma medida disruptiva. O que proponho é que o Governo crie um programa destinado a sectores de actividade inexistentes em Portugal (secundários ou terciários), criando condições excepcionais para a captação de IDE nestes sectores de actividade. Uma das medidas passaria pela criação de ausência de IRC durante 5 anos e forte redução de IRC nos 5 anos seguintes, em projectos de investimento a 20 ou 25 anos, com fortes penalizações para desinvestimento. Por outro lado, a criação de competências de educação e know how especifico nesses sectores de actividade, que conjugados com a já fortemente competitiva oferta de terrenos das autarquias permitiria um pacote muito interessante para que a AICEP pudesse captar investimento de forma célere e com assinalável dimensão, sem pôr em causa factores concorrenciais. Este IDE (ou mesmo investimento dos players nacionais) permitiria aumentar o emprego e através dele o consumo ou a poupança, sem influencia negativa no resto do mercado. No longo prazo, sustentaria melhores condições estruturais para o país e maiores receitas para o Estado.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

In Directas

O PSD evoluiu recentemente para eleições directas. Luis Filipe Menezes ganhou, para surpresa de alguns, e iniciou um mandato repleto de lutas internas, sem aparente proveito para o partido. Na realidade, as bases elegeram, mas a estrutura do partido continuou a controlar, não permitindo que o líder pudesse liderar. A questão é saber se as eleições directas são suficientes para as bases liderarem um partido.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Sunday, Bloody Sunday

“Levanto-me para o que penso ser um Domingo de descanso. Um dia de recuperação, um momento de descontracção, a pausa merecida, o relaxe esperado. O primeiro momento alto devia ser um banho quente e retemperador, mas uma falha de gás obriga-me a um duche rápido e gelado, aparentemente porque ninguém está no piquete da empresa fornecedora, o que considero lamentável e incompreensível. Consciente que a lei de Murphy me aumenta as probabilidades de mais “momentums horribilus” como este, procuro tranquilizar-me com a excelência das ideias para programa que tinha mentalmente anotado antes de adormecer, criadoras de uma expectativa de um Domingo único. O pequeno almoço em casa torna-se impossível sem gás, pelo que – sem dramas – me decido por seguir para o Molhe, pensando em como um problema se pode tornar numa saudável oportunidade de melhoria. Desço a escadaria já preocupado, ao ver as esplanadas vazias. O sol já vai alto e o dia está perfeito, pelo que só há uma razão para o que pupilas focam e o cérebro confirma : os cafés estão fechados, as portadas de madeira envelhecida pela humidade do mar, e eu penso porquê. Um velho de bigode e cana de pesca murmura que é Domingo, ninguém trabalha e também não haveria pão fresco. “Uma vergonha”, remata, virando-se de novo para a imensidão do azul. Não penso em nada, reparo no lixo da praia e lentamente aceno a cabeça negativamente, surpreendido com o estado das coisas. Sei que o Parque da Cidade e Serralves estão fechados ao Domingo para descanso do pessoal e que não havia recolha de lixos no dia santo. Mas que a situação era dramática, ainda não tinha percebido. Ligo o Ipod, e passeio pela marginal até ao quiosque, onde pretendo comprar o Expresso de ontem. Fechado. Volto a casa, entro no carro e sigo até ao hipermercado, mas o cenário é igual. No parque de estacionamento, um mini gangue parte o vidro de um carro e eu recordo-me que o sindicato das empresas de vigilância negociou com o MAI a proibição total de trabalhar ao Domingo. Sem jornal, ligo à minha irmã para combinar o almoço, feliz pela operadora não ter tido avarias irreparáveis ao Domingo. Reparo quase em pânico que o gasóleo está nas últimas, e sei que só amanhã poderei resolver esta situação. Encosto o carro junto a um passeio e sigo pela marechal a pé. Procuro imaginar o resto do dia, sem grandes soluções. Cinema? Fechado. Teatro ao Domingo? Impossível. Subir o rio de barco? Não há cruzeiros ao Domingo e não me atrevo àquelas zonas sem segurança a este dia da semana onde tudo parece não funcionar… nada parece mais descanso ou descontracção. Telefona-me o Jorge, furioso porque vai chegar atrasado. Desde que fecharam as auto estradas ao Domingo para descanso obrigatório dos portageiros e restante pessoal técnico, viajar tornou-se um pesadelo. Um pesadelo de Domingo, é isto que antevejo de repente, zangado comigo e com todos. Sento-me num banco em Cristo Rei e percebo lentamente que há apenas uma coisa que ainda não fechou ao Domingo. Pergunto-me se é por ela que devemos todos abdicar de um dia de lazer, com acesso a tudo que nos faz falta para poder realmente usufruir. Fará sentido um Domingo assim?” O único argumento que hoje os que defendem as restrições para funcionamento do comércio ao Domingo têm é o do descanso dos trabalhadores, provada que está a importância da liberalização na competitividade, no emprego e na conveniência dos consumidores. Trata-se contudo de um argumento que perdeu validade. Não hoje, nem ontem, mas há décadas. A vida numa sociedade civilizada não permite descanso e recuperação sem a existência continuada de serviços de suporte, garantidos por parte da população, que descansará noutro dia. Esta realidade não tem nada de novo, de tão óbvia até parece redundante. É por tal razão que na falta de argumentos os arautos da defesa cega do proteccionismo bradam, ralham e gritam, em desespero por saber que não têm a razão do seu lado.