Não constitui novidade que a moda portuguesa tem conseguido impor a sua marca, o seu estilo, a sua presença, dentro como fora de portas. O “mundo da moda”, os alegados prescritores dos hábitos nas próximas estações, está bem à frente, perto dos líderes mundiais do sector. Um pouco atrás, mas suficientemente perto. No entanto, da moda desenhada até à marca conseguida, da ideia até à produção, do conceito ao sucesso, da prescrição à venda, há um longo caminho a percorrer.
Há uma ou duas décadas atrás, o têxtil português estava no estado em que hoje se encontram alguns dos países de leste, totalmente dependente das grandes marcas mundiais, em regime de pura subcontratação e dependência. Da Marks & Spencer à Ecco, da Donnay à Adidas, as marcas procuravam a mão-de-obra nacional, que juntava um custo baixo a algum know how, sobretudo no Minho e na Beira Interior. Estes eram os dois factores cruciais para as marcas multinacionais fabricarem os seus produtos bem e barato. A entrada na CEE em 86 abriu algumas fronteiras para os gigantes mundiais, que reconheciam em Portugal, para além de mão-de-obra barata, a proximidade necessária aos mercados mais importantes (estrategicamente entre a Europa Central e os Estados Unidos), know how (incluíndo algum conhecimento especifico e diferenciado nas tinturarias), promessa de criação de redes viárias e estruturas base e estabilidade política. Na altura, não havia praticamente marcas nacionais de moda à venda com sucesso, excepto talvez o Grupo Maconde.
A realidade socioeconómica começou a mudar, vieram os ciclos e as crises, a entrada de outros países mais competitivos ao nível de custo e deu-se início à fase do crivo: os que simplesmente faliram, os que – depois de se modernizarem e reestruturarem - continuaram em regime de subcontratação e que hoje trabalham para empresas como a Inditex, a Gant ou a Agatha Ruiz de la Prada e finalmente os que construíram as sua próprias marcas, que passaram a ocupar, mês após mês, mais tempo das máquinas outrora semi desaproveitadas, até finalmente darem por terminados os trabalhos de subcontratação, para se centrarem apenas na sua ou nas suas marcas. Este processo deu-se por duas formas distintas – os industriais do têxtil que fizeram as suas marcas de raiz (Impetus, Salsa, Tiffosi, ou Dielmar) e os que as adquiriram no mercado (Cenoura, Acetato). Há ainda os que, à semelhança dos gigantes, se concentram a gerir a marca e a subcontratar eles próprios (Throttleman, Sacoor). Pelo caminho, ficaram outros que tentaram construir as suas marcas tendo como prioridade a alocação dos seus recursos industriais existentes, em vez das necessidades do mercado.
O grande desafio para os gestores de marcas de moda, sejam industriais ou não, não se limita a vender muito e consequentemente lucrar imenso: é antes criar um capital perene, que permita estabelecer uma estratégia lucrativa no longo prazo. De notar que tal pode ser concretizado recorrendo a uma aposta em boa presença da marca da roupa (Lion of Porches, Boxer Shorts, Giovanni Galli), ou simplesmente na loja (Dielmar, Dom Colletto, Lanidor).
O facto dos hábitos de consumo ligados ao têxtil dependerem cada vez mais da ligação com os previamente referidos prescritores de moda, ou designers de colecções, estilos e sobretudo – mais do que tudo o resto – tendências, assim como das socialmente designadas tribos urbanas (betos, skaters,yuppies,…), faz com que possa existir um efeito de “pico de moda” repentino e momentâneo, que depois tem dificuldade em sobreviver com perenidade. A este efeito, que em Portugal não tem nome conhecido, chama-se no mundo da moda um Fad, ou simplesmente um Craze. Entre as marcas referidas, a maioria viu o seu nome ganhar notoriedade ao longo de vários anos, a pulso. No entanto, há as que sofreram um Fad – a Salsa e a Sacoor nomeadamente. Ambas as empresas souberam, através de uma estratégia de permanente mudança e readaptação, manter-se fora dos habituais precipícios que esperam as marcas saídas de um Fad. A Converse (All Star) ou a Resina são exemplos de empresas a quem isso já aconteceu, na última década. Para tal, é preciso ter uma estratégia de mudança quando se está num dos momentos altos, em vez de fazer durar o mais possível cada sucesso imediato. Saber continuar na moda por muitos e bons anos é hoje o grande desafio das marcas nacionais que souberam habilmente conquistar o seu espaço no mercado.
1 comentário:
Pedro: bom post.
Contudo, penso que o aparecimento em Portugal de sectores industriais de sucesso foi anterior à entrada na CEE. Julgo que o grande impulso foi a adesão à EFTA uns anos antes.
Em relação ao têxtil português, existe um factor que me preocupa: há muitas fábricas excessivamente dependentes de um ou dois clientes. O que é perigoso.
Ricardo Arroja
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